Os sentimentos são por vezes o pior
inimigo. Tapam os ouvidos, os olhos
ficam enovoados, a boca ganha vida gritando palavras que mais tarde pensamos “como
é que eu disse aquilo”, transformam o nosso cérebro num ser à parte, dotado de personalidade
própria. Deixamo-nos conduzir pela sensação de raiva, de ódio, de amor, de
carinho. O nosso corpo deixa de ser nosso e passa a navegar nesse turbilhão de
emoções que queima a pele e que nos faz agir feito marionetas comandadas por
uma força superior.
E tudo em nós é emoção, mesmo
quando vestimos a capa da frieza, mesmo quando mostramos ao mundo que somos
feitos de um ferro que nada nem ninguém consegue perfurar. E é nesse escudo que
nos escondemos, ferindo-nos para não ferir, calando para não gritar, sorrindo
para não chorar.
Há momentos que só nos apetece
deixar explodir, que queremos abrir os pulmões e deixar sair todas as perguntas
sem resposta, todos os pensamentos guardados, todas as dúvidas que sufocam como
um veneno lento que nos mata todos os dias um bocadinho.
Mas é preciso calar, fingir,
aprender os gestos e a forma da sociedade. Uma sociedade que não entendes, que
repudias, que te causa por vezes naúseas, que te faz querer esconder, mas perante
a qual te encontras nua e exposta, como um alvo iluminado.
É preciso dizer que se entente a
hipócrisia, a mentira, a falsidade, o jogo do mais forte, as palavras que
magoam, os gestos que ferem, as atitudes que criam chagas, um gosto de ti mas
esqueço que tu existes...É preciso sorrir e ser gentil quando ouvimos alguém
dizer que gosta de amarelo, mas tudo o que tem é vermelho.
E assim forçamos o sorriso e
caminhamos sem saber para onde ir e como ir, tentando agir imitando os gestos,
as palavras, as acções, guardando dentro de nós o mundo em que acreditamos, para que não sejamos a aberração deste circo
sem tenda e sem risos!