Muitas vezes acontece que simples conversas de café, banais como só
elas sabem ser, transformam-se em algo mais profundo quando a só estamos. Longe
dos risos e das brincadeiras, do convivio necessário a todo o ser humano,
damos por nós a pensar naqueles momentos trivias e nas palavras ditas meio a
sério, meio a brincar. Basta apenas uma história e damos por nós a
identificarmo-nos com as sensações, com os pensamentos, com as memórias expostas
à luz do dia.
É quase como abrir uma porta e olhar de fora para uma vida que é nossa,
mas que nos parece distante, vivida por outros. E assim é o amor. Feito de momentos, de partilha , de cumplicidade, de troca de
afectos, de palavras, de gestos tão corriqueiros como um café na esplanada, um
beijo roubado no meio da rua, um amo-te sussurado quando menos se espera, o
brilho nos olhos quando se faz amor. Mas os dias passam, as semanas somam-se e
aqueles que nos eram tão familiares transformam-se em estranhos ali ao nosso
lado.
De repente, num estalar de dedos, o mal estar se instala ao recordar as
frases que nunca deveriam ter sido sequer pensadas tão pouco pronunciadas com a
determinação dos carrascos. Não se pode atravessar uma ponte que foi queimada;
com as palavras acontece a mesma coisa.
E a distância ganha morada e apaga a intimidade, modifica a necessidade
que em tempos julgávamos sentir um pelo
outro. Deixamos de lado o apelo de ligar
a contar o nosso dia,as nossas alegrias, as nossas decepções.E chega o momento
em que perdemos a fala. Tentamos emitir
um som que quebre esse pesar mas medimos
as frases, pois apenas nos resta o nada. Aos poucos apercebemo-nos que não nos
conhecemos. Somos apenas dois corpos sem rosto no meio da multidão.
Matamos a cumplicidade, que provavelmente foi apenas ilusão. Deixamos
de desejar a pele na pele, de ansiar pelo toque,de querer o beijo. O
brilho apaga-se, a paixão esfria e já nem a frustração subsiste. Já não se
acorda a pensar no outro, já não se deita a desejar o quente do corpo que nos fazia falta.
E aquela dor que insistia em se
fazer notar, que trazia ao pensamento, minuto a minuto, a pessoa amada dá lugar
a outras lembranças, a novos rumos.
Caminhamos dia após dia em estradas distintas. Fingimos “um esta tudo bem”, mas construimos o vazio em nosso
redor. Nem o olhar permanece porque
ambos sabem que não têm mais o que fazer. Dentro cresce uma dor contínua, uma
tristeza que sai pelos olhos. Os dois corações estão ocos, porque no lugar do
amor agora não existe nada. E a vida segue assim, imperfeita...